quinta-feira, 29 de maio de 2014

INCONDICIONAL

Só podemos encontrar paz e felicidade no amor quando abrimos mão das condições que colocamos no nosso amor pelos outros.

Assim inicia um dos capítulos da obra Os segredos da vida, a doutora Elizabeth Kübler-Ross, célebre estudiosa suíça, pioneira devotada ao trabalho com pacientes terminais.

Continua ela dizendo que geralmente impomos as condições mais duras àqueles que mais amamos.

O processo de abandonar condições e expectativas é extremamente difícil, porque, desde que nascemos, nos ensinaram o amor condicional.

Seríamos amados se fôssemos dóceis, obedientes, estudiosos, bem-comportados e por aí adiante. Havia sempre um “se”.

A escritora ainda afirma que uma das poucas ocasiões em que recebemos amor incondicional é quando nossos filhos são bem pequenos.

Eles não se importam com nosso status, o nosso dinheiro ou as nossas realizações. Eles simplesmente nos amam.

Somos nós que acabamos lhes ensinando a colocar condições no amor quando os recompensamos ao sorrir, tirar boas notas e ser o que queremos que eles sejam.

Se amássemos nossos filhos apenas um pouco mais incondicionalmente, por um pouco mais de tempo, talvez pudéssemos criar um mundo muito melhor para se viver.

* * *

A proposição de Kübler-Ross pode parecer um clamor utópico, é certo.

Uma realidade ainda muito distante, tendo em vista o nível de nossos relacionamentos atuais no mundo. Mas que isso não nos impeça de começar a trabalhar em prol dessa conquista.

Talvez a primeira tentativa esbarre no sentimento do medo, do medo de não ser correspondido, de não ser reconhecido.

Mas, ao compreender que a alegria, a gratificação que procuramos, está sobretudo no dar e não no receber, perceberemos que mesmo o gesto de amor que parece não ter sido identificado, quem dera retribuído, nos preenche, nos faz um bem muito grande.

O maior beneficiado do amor incondicional é sempre seu doador. Quando se acende uma lâmpada – disseram um dia – a primeira superfície que se ilumina é ela mesma.

Está aí a recompensa do amor.

O criador, quando na intimidade de seu universo infindo, deu vida ao amor, fê-lo autossustentável. Em sua essência ele não apresenta condições.

Lembremos-nos de uma situação em que pudemos fazer um bem a alguém. Uma felicidade que tenhamos proporcionado, ou um pequeno favor que seja.

Recordemos do prazer sentido, do sentimento talvez indescritível de tranquilidade, de uma certa paz.

Pois é esse sentimento que a natureza plantou em nosso íntimo, para que procurássemos o bem, para que procurássemos o amor.

É a lei de amor se manifestando em uma de suas milhares de formas.

Busquemos, assim, o amor sem exigências, sem cláusulas, e nos deleitemos com a felicidade de amar.

Nossos filhos merecem nosso amor, independentemente se são bons filhos, se vão bem na escola, se são obedientes.

Na função de cocriadores, missão divina recebida, nosso compromisso maior está em amar.

Grande parte dos distúrbios, dos desequilíbrios trazidos pelos Espíritos em suas novas empreitadas terrenas, consegue suavização apenas através do amor.

Precisamos mostrar aos nossos rebentos que são amados.

Para isso, cabe a cada pai, a cada mãe, a busca pelo aprimoramento na arte de formar caracteres, a busca pelo estudo que lhes orientará sobre a melhor forma de colocar seu amor em prática.

Redação do Momento Espírita, com base no
livro Os segredos da vida, de Elizabeth Kübler-Ross e
David Kessler, ed. Sextante.
Em 23.5.2014.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

JESUS MANDOU ALGUÉM

Pelo Espírito Hilário Silva. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

Livro: Idéias e Ilustrações. Lição nº 35. Página 133.

O culto do Evangelho no lar havia terminado às sete da noite, e João Pires, com a esposa, filhos e netos, em torno da mesa, esperava o café que a família saboreava depois das orações.

Ana Maria, pequena de sete anos, reclamou:

- Vovô, não sei por que Jesus não vem. Sempre vovô chama por ele nas preces: “Vem Jesus! Vem Jesus!” e Jesus nunca veio...

O avô riu-se, bondoso, e explicou:

- Filhinha, nós, os espíritas, não podemos pensar assim... O Mestre vive presente conosco em suas lições. E cada pessoa do caminho, principalmente os mais necessitados, são representantes d’Ele, junto de nós... Um doente é uma pessoa que o Senhor nos manda socorrer, um faminto é alguém que Ele nos recomenda servir...

D. Maria, a dona da casa, nesse momento repartia o café, e, antes que o vovô terminasse, batem à porta.

Ana Maria e Jorge Lucas, irmão mais crescido, correm para atender.

Daí a instantes, voltam, enquanto o menino grita:

- Ninguém não! É só um mendigo pedindo esmola.

- Que é isso? – exclama a senhora Pires, instintivamente – a estas horas?

Ana Maria, porém, de olhos arregalados, aproxima-se do avô e informa, encantada:

- Vovô, é um homem! Ele está pedindo em nome de Jesus. É preciso abrir a porta. Acho que Jesus ouviu a nossa conversa e mandou alguém por Ele...

A família comoveu-se.

O chefe da casa acompanhou a netinha e, depois de alguns instantes, voltaram, trazendo o desconhecido.

Era um velho, aparentando mais de oitenta anos de idade, de roupa em frangalhos e grande barba ao desalinho, apoiando-se em pobre cajado.

Ante a surpresa de todos, com ar de triunfo, a menina segurou-lhe a mão direita e perguntou:

- O senhor conhece Jesus?

Trêmulo e acanhado, o ancião respondeu:

- Como não, minha filha? Ele morreu na cruz por nós todos!

E Ana Maria para o avô:

- Eu não falei, vovô?

O grupo entendeu o ensinamento e o recém-chegado foi conduzido à poltrona. Alimentou-se. Recebeu tudo o que precisava e João Pires anotou-lhe o nome e endereço para visitá-lo no dia seguinte.

Antes da despedida, a pequena dormiu feliz, e, após abraçar o inesperado visitante, no “até amanhã”, o chefe de família, enxugando os olhos, falou, sensibilizado:

- Graças a Deus, tivemos hoje um culto mais completo.

sábado, 24 de maio de 2014

O PRÍNCIPE ENCANTADO - Richard Simonetti
Dizia estar à procura de seu príncipe encantado.

Só que o fazia de forma errada, cultivando experiências amorosas promíscuas, em atividade inconsequente e comprometedora.

 Os familiares preocupavam-se. Sua mãe a aconselhava. O pai aborrecia-se. Os irmãos faziam ameaças... Tudo inútil.

 – Sou independente, maior de idade, dona de meu nariz – retrucava Marta, julgando-se gente, só porque, aos 22 anos, concluíra a Faculdade, tinha bom emprego, bela aparência, numerosos admiradores.

 E petulante, contestadora:

– Considero-me uma mulher liberada, com direito de relacionar-me afetivamente com quem desejar. Casar-me-ei um dia, terei filhos, mas só quando encontrar meu príncipe. O modo como o procuro é problema meu! Não me aborreçam!...

 Um dia engravidou. 

A primeira reação: abortar.

Chegou a procurar um médico amigo. Não conseguiu, entretanto, consumar o ato criminoso. Estranhamente, o pequenino ser que levava em suas entranhas a sensibilizara. 

Não sabia explicar exatamente o que ocorria, mas sentia, com todas as forças de sua Alma, que desejava aquele filho.

Na medida em que a gestação avançou, foi forçada a informar a família.

Os pais ficaram horrorizados. Era preciso tirar a criança. Família bem posta na sociedade, seria uma vergonha...

 Marta resistiu com a desenvoltura de sempre. O filho era seu. Ficaria com ele. Devotava-lhe, desde o início, incontido amor. 

Desejava, ardentemente, tê-lo em seus braços. Iria embora se insistissem! Jamais renunciaria à criança!...

Os familiares, que a conheciam suficientemente, concluíram que seria inútil tentar demovê-la e decidiram assumir a situação. 

Com o passar do tempo, observaram, agradavelmente surpresos, que, acompanhando a evolução da gestação, a jovem passava por radical transformação. 

Tornou-se mais comedida, já não saía tanto, deixou a bebida e o cigarro, afastou-se de amizades indesejáveis, perdeu o contato com os rapazes...

Apesar dos percalços, a criança que estava por vir atuava providencialmente em seu benefício.

 Finalmente chegou o grande dia. Experimentando as primeiras contrações, Marta foi levada ao hospital. Atendida prontamente, em breve nascia um belo menino, sorridente e calmo.

 Toda a família logo se tomou de amores por ele, particularmente a jovem, que, sem o saber, detinha nos braços seu “príncipe encantado”, nobre entidade espiritual ligada a ela desde recuada época. Viera em seu socorro para afastá-la da inconsequência...

Há Espíritos que retornam à carne em experiências sacrificiais. 

Embora as abençoadas oportunidades de aprendizado, suas existências são marcadas, sobretudo, pelo compromisso maior de auxiliar companheiros retardatários.

Sua presença desperta neles incontidos anseios do coração, ajudando-os a afastarem-se de perigosas ilusões.
 

sexta-feira, 23 de maio de 2014

FILHOS DIFERENTES

Pelo Espírito Emmanuel. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

Livro: Encontro Marcado. Lição nº 34. Página 109.


Provavelmente, conhecê-lo-ás no mais íntimo da alma: Os Filhos Diferentes.

Conseguiste instruir os outros. Encaminhá-los para o bem com facilidade.

Mas encontraste aquele que não se afina com os teus ideais. É um filho que não se erige à altura do padrão doméstico a que te elevaste, ou uma filha que te desmente a esperança.

É possível hajas verificado a desvantagem quando já existe enorme distância do ente querido à harmonia familiar.

Percebeste-lhe as falhas com a surpresa do cultivador, quando identifica uma planta de bela aparência que a praga carcome, ou com o desencanto de quem vê repentinamente comprometida a empresa levantada à custa de sonhos e canseiras de muitos anos.

Quanto te observes perante um filho diferente, não te permitas inclinar o coração ao desespero ou à amargura.

Ora e pede luz para o entendimento.

O Senhor te fará reconhecer-te à frente do companheiro ou da companheira de outras existências terrestres, que o tempo ocultou e que a Lei te oferece de novo à presença para que a tua obra de amor seja devidamente complementada.

Jamais ergas a voz para acusar o filho-problema, conquanto nem sempre lhe possas elogiar a conduta.

Longe ou perto dele, segundo as circunstâncias do plano físico, ampara-o com tua prece, estendendo-lhe apoio e inspiração pelas vias da alma.

Embora no dever de corrigi-lo, ainda mesmo quando te não compreenda ou te evite o passo, abençoa-o tantas vezes quanto te fizerem precisas, ensinando-lhe outra vez o caminho da retidão e da obediência, selecionando para isso as melhores palavras que as lutas da vida te hajam gravado no sentimento.

Ninguém te pode penetrar a angústia e o enternecimento de pai e mãe, junto dos filhos que se fizeram enigmas; à vista disso, é natural que muitas vezes o teu procedimento diante deles assuma aspecto de exceção.

Auxilia-os sempre e, mesmo nos dias em que a saraivada de críticas humanas te assedie a cabeça, conchega-os mais brandamente ao regaço do teu espírito; sem que o verbo humano consiga expressar as sensações de teu amor ou de tua dor, ante um filho diferente, sabes, no imo da alma, que ele significa o mais alto encontro marcadoentre a tua esperança e a bondade de Deus.
 

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Nunca dorme – Orson Peter Carrara

 É uma avó que conta que certo dia sua filha lhe telefonou do pronto-socorro. Sua neta, Robin, de apenas seis anos, tinha caído de um brinquedo no pátio da escola e havia ferido gravemente a boca.
A avó foi buscar as irmãs de Robin na escola e passou uma tarde agitada e muito tensa, cuidando das crianças, enquanto aguardava que a filha retornasse com a menina machucada.
Quando finalmente chegaram, as irmãs menores de Robin correram para os braços da mãe. Robin entrou silenciosa na casa e foi se sentar na grande poltrona da sala de estar.
O médico havia suturado a boca da menina com oito pontos internos e seis externos. O rosto estava inchado, a fisionomia estava modificada e os fios dos cabelos compridos estavam grudados com sangue seco.
A garotinha parecia frágil e desamparada. A avó se aproximou dela com o máximo cuidado. Conhecia a neta, sempre tímida e reservada.
“Você deseja alguma coisa, querida?”, perguntou.
Os olhos da menina fitaram a avó firmemente e ela respondeu: “quero um abraço.”
À semelhança da garotinha machucada, muitas vezes desejamos que alguém nos tome nos braços e nos aninhe, de forma protetora.
Quando o coração está dilacerado pela injustiça, quando a alma está cheia de curativos para disfarçar as lesões afetivas, gostaríamos que alguém nos confortasse.
Quando dispomos de amores por perto, é natural que os busquemos e peçamos: abrace-me. Escute-me. Dê-me um pouco de carinho. Um chá de ternura.
Contudo, quando somos nós que sempre devemos confortar os outros, mais frágeis que nós mesmos, ou quando vivemos sós, não temos a quem pedir tal recurso salutar.
Então, quando estivermos ansiosos por um abraço consolador nos nossos momentos de cansaço, de angústia e de confusão, pensemos em quem é o responsável maior por nós.
Quando não tivermos um amigo a quem telefonar para conversar, conversemos com nosso pai. Sirvamo-nos dos recursos extraordinários da oração e digamos tudo o que ele, como onisciente, já sabe, mas que nós desejamos contar para desabafar, aliviar a tensão interna.
Falemos das nossas incertezas e dos nossos dissabores, sobre as nossas decepções e nossos desacertos e nos permitamos sentir o envolvimento do seu abraço de pai amoroso e bom.
Não importa como o chamemos: pai, Deus, Criador, Divindade. O importante é que abramos a nossa intimidade e nos permitamos ser acarinhados por Ele.
Ele sempre está pronto para abraçar Seus filhos sem impor condições.
E se descobrirmos que faz muito tempo que não sentimos esse abraço divino, tenhamos a certeza de que faz muito tempo que não o pedimos.
***
Victor Hugo, poeta e romancista francês escreveu um dia: tenha coragem para lidar com as grandes tristezas da vida. E paciência para lidar com as pequenas.
E, depois de ter cumprido laboriosamente sua tarefa diária, vá dormir em paz.
Deus continua acordado.
Pensemos nisso. Deus está sempre acordado, e velando por nós.

 

quarta-feira, 21 de maio de 2014

EREMITAS DO ASFALTO - Richard Simonetti
No passado muitos buscavam solidão, instalando-se em lugares desertos para fugir às tentações, aos problemas de convivência ou, simplesmente, por misantropia - o horror ao contato humano.

Semelhante comportamento é indesejável. Estamos programados para o relacionamento social. O insulamento nos desajusta. O eremita tende a resvalar, não raro, para a excentricidade..

A urbanização, a concentração populacional em cidades, gera salutar interdependência. No convívio urbano não satisfazemos nenhuma necessidade, não desenvolvemos atividade alguma sem mobilizar recursos gerados por outras pessoas. Usamos roupas que não confeccionamos, consumimos alimentos que não produzimos, dispomos de móveis e objetos que não fabricamos, frutos do esforço de muita gente.

A interdependência neutraliza a tendência ao insulamento, desenvolvendo nossas potencialidades como seres sociais.
 
Não se pode afirmar, entretanto, que a misantropia esteja plenamente superada. São numerosos os eremitas urbanos, indivíduos que não se envolvem com os problemas comunitários, pretendendo edificar um oásis particular, em pleno deserto das misérias humanas, ignorando multidões que sofrem privações amargas e dolorosas provações.

Os eremitas do passado refugiavam-se em cavernas exíguas e isoladas, inspirados em sonhos de tranquilidade que sempre terminavam em pesadelos de desequilíbrio.

Os eremitas do presente isolam-se em amplas e confortáveis cavernas, desobrigados até de sonhar, porquanto a televisão o faz por eles, embalando-os num mundo de fantasias diante do qual se quedam estáticos. O preço é alto: a alienação dos valores mais nobres da existência e, sobretudo, o comprometimento da condição humana, que não pode ser sustentada sem convívio social e o envolvimento com a comunidade. Resultados: depressão, insatisfação, angústia, enfermidade, crônica infelicidade.

Vanguardeiros da medicina psicossomática concebem que a participação na vida comunitária, a integração em organizações de assistência e promoção humana são fundamentais em favor de nossa saúde física e psíquica. Prescrevem aos pacientes um medicamento infalível: a ocupação de seu tempo disponível em favor do semelhante.

Nesse particular é forçoso reformular o conceito de atividade profissional. Para a maioria das pessoas o serviço remunerado é apenas um recurso que atende à subsistência. No entanto, muito mais que isso, ele é fatos de integração social, de nossa realização como seres humanos, convocados a contribuir em favor do bem-estar da comunidade.

Há uma enorme diferença de competência e dedicação entre o médico que exercita seus conhecimentos para ganhar dinheiro e aquele que faz de sua profissão um sacerdócio em favor da saúde humana.

Da mesma forma, não há nenhuma dúvida na escolha entre o patrão que vê no seu negócio apenas uma máquina de fazer dinheiro em favor de seu conforto, e aquele que se sente responsável pelo bem-estar de seus funcionários. Ninguém gostaria de trabalhar para o primeiro.

Assim, em qualquer setor de atividade humana, somente nos integraremos realmente na sociedade em que vivemos quando passarmos da misantropia egoística para a filantropia altruística - o cultivo do amor pela Humanidade.

Seguem esse caminho abençoado aqueles que se empenham por ser úteis, buscando ajudar o semelhante em suas necessidades, onde estiverem, conscientes de que serão felizes na medida em que trabalharem pela felicidade alheia.

quarta-feira, 14 de maio de 2014



O EXEMPLO DA FONTE

Pelo Espírito Meimei. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

Livro: Idéias e Ilustrações. Lição nº 08. Página 38.

Um estudante da sabedoria, rogando ao seu instrutor lhe explicasse qual a melhor maneira de livrar-se do mal, foi por ele conduzido a uma fonte que deslizava, calma e cristalina, e, seguindo lhe o curso, observou:

- Veja o exemplo da fonte, que auxilia a todos, sem perguntar, e que nunca se detém até alcançar a grande comunhão com o oceano.

Junto dela crescem as plantas de toda a sorte, e em suas águas dessedentam-se animais de todos os tipos e feitios.

Enquanto caminhavam, um pequeno atirou duas pedras a corrente e as águas as engoliram em silêncio, prosseguindo para diante.

- Reparou? - disse o mentor amigo - a fonte não se insurgiu contra as pedradas. Recebeu-as com paciência e seguiu trabalhando.

Mais à frente, viram grosso canal de esgoto arremessando detritos no corpo alvo das águas, mas a corrente absorvia o lodo escuro, sem reclamações, e avançava sempre.

O professor comentou para o aprendiz:

- A fonte não se revolta contra a lama que lhe atiram a face. Recolhe-a sem gritos e transforma-a em benefícios para a terra necessitada de adubo.

Adiante ainda, notaram que, enquanto andorinhas se banhavam, lépidas, feios sapos penetravam também a corrente e pareciam felizes em alegres mergulhos.

As águas amparavam a todos sem a mínima queixa.

O bondoso mentor indicou o lindo quadro ao discípulo e terminou:

- Assinalemos o exemplo da fonte e aprenderemos a libertar-nos de qualquer cativeiro, porque, em verdade, só aqueles que marcham para diante, com o trabalho que Deus lhes confia, sem se ligarem às sugestões do mal, conseguem vencer dignamente na vida, garantindo, em favor de todos, as alegrias do Bem Eterno.

terça-feira, 13 de maio de 2014


SE A ALMA NÃO É PEQUENA - Richard Simonetti

 

Nem sempre as pessoas fazem o que querem; nem sempre querem o que fazem.

 A criança gostaria de ficar brincando. Os pais impõem-lhe a escola, em seu próprio benefício. O doente não tem nenhuma disposição para internar-se no hospital. Inadiável, porém, a cirurgia para debelar o mal que se agrava. O operário preferiria o clube. Impossível. A família depende de sua atividade profissional.

 Algo semelhante ocorre na experiência reencarnatória, indispensável recurso evolutivo no estágio em que nos encontramos. Retornaremos à carne vezes sem conta, até que nos tornemos aspirantes à angelitude.

 Espíritos imaturos estimariam permanecer numa boa, evitando as limitações da matéria, as complicações do esquecimento, os problemas de reconciliação com desafetos, o suor do rosto, as dores do mundo, as angústias existenciais... Mesmo os mais esclarecidos encaram com relutância o retorno, embora conscientes de que, como diria Camões, reencarnar é preciso.
Não raro o Espírito sente-se tão inseguro ou tão contrariado, reluta tanto que chega a rejeitar a experiência que se inicia. Dispara ele próprio problemas fetais que podem resultar no aborto.

 Esta fuga acontece particularmente no início da gestação, quando tênues são os laços que o prendem ao corpo.

 A gestante nem chegará a perceber, julgando-se às voltas com mero atraso no ciclo menstrual. Há casos em que se consuma a reencarnação, mas o Espírito recusa-se à nova existência, originando um comportamento autista, como se buscasse esconder-se dentro de si mesmo.

 Fácil concluir que reencarnar não é simples ligar de uma tomada. Há vários fatores que precisam ser harmonizados. Imperioso, sobretudo, trabalhar os pais para que se disponham ao encargo, evitando grave problema: a rejeição.

A jovem senhora vai buscar o resultado do teste de gravidez.

 No papel que lhe é entregue destaca-se o desenho de uma cegonha carregando sorridente bebê, simpática maneira escolhida pelo laboratório para transmitir-lhe a notícia de que o resultado é positivo. Será novamente mãe.

­− Meu Deus! Outro filho! Vai complicar!

A reação do marido é pior: − Culpa sua! Bem avisei que não deveria interromper o uso das pílulas!

 − E continuar engordando como suíno confinado!... Por que não fez você a vasectomia, como recomendou o médico?!

 Acirra-se a discussão. O ambiente esquenta. Agridem-se verbalmente os cônjuges, trocando acusações e asperezas...

Pobre reencarnante!... Como se sentirá? Um enjeitado, sem dúvida. Será difícil evitar a sedimentação da ideia de que o consideram um intruso, alguém que veio para atrapalhar, sem pedir licença.

E quanto a nós, qual teria sido a nossa motivação para o retorno à carne? Não é difícil definir. Basta analisar como encaramos a existência. Gastamos tempo a reclamar do cotidiano? Damos guarida a mágoas e irritações? Resvalamos para estados depressivos e angustiantes? Desentendemo-nos frequentemente com pessoas de nossa convivência? Sucedem-se, ininterruptos, desajustes físicos e psíquicos que nos incomodam?

 Se a resposta é afirmativa, estamos numa compulsória. Reencarnamos meio na marra, como diz o povo.

 Mas podemos mudar isso, considerando que é irrelevante como viemos. Importante é saber o que nos compete fazer na experiência humana. Neste particular o Espiritismo tem muito a nos oferecer, ensinando-nos, sobretudo, que nossa vida será exatamente o que dela fizermos. Por opção diária, não seja a Terra para nós uma jaula, uma prisão, um hospital, um reformatório...

 Vejamo-la sempre como abençoada escola/oficina, onde nos compete valorizar todas as experiências em favor de nossa edificação. Ensina Fernando Pessoa, o poeta filósofo: Tudo vale a pena, se a alma não é pequena. Dores e lutas, trabalhos e esforços a que somos chamados na Terra, desde o simples varrer de uma casa às funções mais complexas, tudo vale a pena, se desenvolvermos em nossa alma a grandeza necessária para enxergar a oportunidade de fazer sempre o melhor.

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Culpa e perdão a si mesmo – Orson Peter Carrara – 

Entrevistei a psicóloga clínica Cláudia Gelernter, de Vinhedo-SP, sobre a severidade do remorso, uma das causas das angústias humanas. A entrevista, na íntegra, ainda está inédita, mas seleciono trechos de duas das respostas: 

7 - Que caso marcante gostaria de transmitir aos leitores?

Certa vez, uma avó me procurou, sofrendo a perda de sua netinha, que desencarnou na piscina de sua casa, então com dois anos de idade. O caso já era grave por si só, mas ainda mais complexo porque foi ela quem esqueceu o portão da grade de proteção da área da piscina aberto. Como aliviar aquela dor? Palavras raramente fazem algum sentido nestes casos, então foi preciso permitir que a dor viesse com toda a sua intensidade a fim de aliviar o represamento da angustia daquela pobre senhora. Depois, sentindo-se amparada, acolhida, pôde falar sobre o seu remorso, sobre a vontade de se auto punir, pelo erro cometido. Já não conseguia mais dormir, não queria se alimentar e pensava em suicídio, constantemente. Fizemos diversos testes de realidade, a fim de demonstrarmos, em conjunto, que o ato não fora intencional, mas que aconteceu por esquecimento. Outro teste servia para resgatarmos a questão de sua vontade, pois autopunir-se não traria a neta de volta ao convívio familiar. Depois de alguns meses, já melhor em seus sintomas, surgiu um presente que jamais esquecerei. Uma daquelas dádivas que Deus nos permite experimentar, a fim de mostrar sua Misericórdia infinita para conosco. Ela conseguiu receber uma mensagem psicografada em Uberaba, com 47 páginas, na qual a menina contava que ela não tivera culpa alguma neste caso, pois estava previsto o desencarne e que a neta nada sentira ao cair na agua pois sua alma “saltou” para o colo de Maria Dolores, enquanto que o corpo se jogara na piscina, já sem vida. Recordo-me que a carta continha dados confiáveis, que só ela e poucos parentes conheciam, como, por exemplo, o nome de uma tia que desencarnou muitos anos antes e que estava ajudando a cuidar dela, no Mundo Espiritual. Surgiu, então, uma nova vida para aquela senhora, com um novo sol a brilhar, mais forte e iluminado ainda: estava provado para ela tanto a questão da imortalidade da alma como a possibilidade de um reencontro, no tempo certo.

8 - Como podemos ajudar alguém em gradativo processo de autopunição por remorsos ou sentimento de culpa?

Escutando a dor do nosso próximo, amorosamente, sem julgamentos nem distrações. Doando nosso tempo, nossa alma, nossas preces em seu favor. E, acima de tudo, demonstrando que estar no mundo engloba erros e acertos, dores e alegrias, tropeços e reerguimentos. Se desejamos mudar o que fizemos, é imperioso saber que não o conseguiremos pelas vias do remorso, mas através do amor que passarmos a irradiar no mundo.

Agora, nem sempre as pessoas possuem as ferramentas necessárias para darem conta desta difícil demanda. Recordemos que muitos pais encucam em seus filhos o remorso como estratégia [equivocada] de educação. Entendamos as diferenças entre todos e sigamos apoiando os que sofrem, em qualquer situação, inclusive aqueles que se encontram presos nas difíceis redes da autopunição. (...).

 
 

quinta-feira, 8 de maio de 2014

AS DUAS FACES  - Richard Simonetti
         Famoso artista começou a pintar um quadro que tinha por tema a vida de Jesus. Durante meses dedicou-se ao gratificante trabalho. Ao final, faltavam duas personagens: Jesus menino e Judas Iscariotes. Meticuloso, pôs-se a procurar os modelos ideais.

Em bairro de periferia encontrou um garoto de sete anos, cujo rosto o impressionou vivamente. Tinha expressão suave, fisionomia tranquila, olhos brilhantes e expressivos, exatamente o que desejava. Conversou com os pais. Conseguiu que o levassem ao ateliê, onde o retratou como Jesus. Restava Judas.

O tempo passou, o quadro empacou. Anos se sucederam, sem que o modelo ideal fosse encontrado. Certa feita um mendigo, embriagado caiu diante dele.

Compadecido, ao tentar erguê-lo, viu-lhe o pintor o rosto bem de perto e estremeceu. Aquela fisionomia atormentada, viciosa, suja, desesperada, era o retrato fiel de Judas!

Emocionado, propôs-lhe: – Venha comigo! Eu o ajudarei!

O infeliz o acompanhou. Chegados ao ateliê, depois de ter satisfeito a fome e a sede do improvisado modelo, o pintor desvelou a tela, dispondo-se a iniciar o trabalho. Entretanto, quando o mendigo a contemplou, desandou em choro convulso.

– Não se lembra de mim? – perguntou. – Há muitos anos estive aqui. Fui eu! Fui eu quem posou para o seu menino Jesus!

Este fascinante episódio dramatiza uma situação que se repete, indefinidamente, no Mundo: a perda da inocência e da pureza, e o comprometimento com vícios e paixões, marcando a transição da infância para a idade adulta. É comum os pais de criminosos que cometeram atrocidades comentarem, em desespero:

– Não posso acreditar que tenha sido nosso filho! Era um menino tranquilo e gentil, incapaz de uma maldade! Como pôde transformar-se num monstro?!

Ensina o Espiritismo que a criança não é um livro em branco. Guarda registros de suas vivências anteriores, com tendências boas ou más adquiridas.

Educar seria não apenas fazer o Espírito entrar na posse de seu patrimônio de experiências pretéritas, mas também ajudá-lo a superar as tendências inferiores resultantes de seus desvios.

Uma das revelações mais importantes da Doutrina Espírita está na questão número 383, de O Livro dos Espíritos, quando Kardec pergunta qual a utilidade da infância, e o mentor informa que nessa fase o Espírito é extremamente sensível às influências que recebe. Muitas de suas tendências inferiores e fragilidades poderão ser superadas com a ajuda dos responsáveis por ela.

Naturalmente, é fundamental que haja o exemplo, que os pais estejam dispostos a viver o que ensinam aos seus rebentos, cultivando um comportamento digno e honrado. De nada adiantará ensinarem ao filho que fumar é nocivo ou que não deve dizer palavrões, se eles próprios o fazem.

Artur Azevedo (1855-1908), escritor e teatrólogo brasileiro, narra ilustrativo diálogo entre pai e filho. O pai, informado de que o menino mentia muito na escola, dá-lhe uma lição de moral, explicando-lhe, com variados exemplos, que é preciso dizer sempre a verdade. Nesse ínterim, batem à porta. O pai terminou a conversa recomendando:

– Vá atender filho. Se for alguém que me procure, diga-lhe que não estou.

***

Bem, caro leitor, face de Jesus menino pode converter-se em nós na face lamentável de Judas, como consequência de nossos desvios do passado e do presente.

É preciso fazer o contrário: a transformar a face de Judas na figura radiante do Cristo, com o esforço perseverante no campo do Bem e da Verdade, buscando superar impulsos e tendências não compatíveis com os valores evangélicos. E isso com tal ardor, que um dia possamos repetir com o Apóstolo Paulo (Gálatas, 2:20): ...e já não sou eu quem vive, mas o Cristo que vive em mim. 
 

quarta-feira, 7 de maio de 2014

RECEITA ESPÍRITA
Pelo Espírito Albino Teixeira. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.

Livro: Caminho Espírita. Lição nº 18. Página 47.



Pensamento sombrio? Alguns instantes de prece.

Irritação? Silêncio de meia hora pelo menos.

Tristeza? Ampliação voluntária da quota de trabalho habitual.

Impulso à crítica destrutiva? Observemos as nossas próprias fraquezas.

Desejo de censurar o próximo? Um olhar para dentro de nós mesmos.

Solidão? Auxiliar a alguém que, em relação a nós, talvez se encontre mais sozinho.

Tédio? Visita a um hospital para que se possa medir as próprias vantagens.

Ofensa? Perdoar e servir mais amplamente.

Ressentimento? Esquecimento de todo mal.

Fracasso? Voltar às boas obras e começar outra vez.

sábado, 3 de maio de 2014

EMOÇÕES E HORMÔNIOS, INSTRUMENTOS DEFINIDORES DA DOENÇA OU SAÚDE - Jorge Luis Salomão

Data de longos anos a preocupação em se descobrir a causa das doenças que tanto afligem a humanidade. E também não é nova a ideia segundo a qual muitas doenças têm origem nas emoções descompensadas. Na remota antiguidade, o grego Hipócrates (460-370), considerado o pai da Medicina, preconizava que a personalidade do ser desempenhava um papel fundamental no equilíbrio ou desequilíbrio orgânico. Isso significa que ele não descartava a influência das emoções como elemento definidor da saúde ou da doença. Tanto é verdade, que ele elaborou a chamada Teoria dos Quatro Humores Corporais: fleugma, sangue, bílis amarela e bílis negra. Ele dizia que a saúde ou a doença estava na dependência direta da existência, em maior ou menor quantidade, dessas substâncias no corpo. Segundo essa teoria, eram essas substâncias que determinavam o temperamento do indivíduo. Há, como se pode ver, uma nítida tendência de se explicar a presença dos distúrbios físicos através da interação mente-corpo. 

Com a evolução da Ciência, especialmente com o surgimento da Biopsicologia, aliada a Psiconeuroimunologia, hoje se tem pleno conhecimento de que os hormônios estão intimamente relacionados ao humor e este, por sua vez, como elemento determinante da saúde ou doença. O estado de humor, portanto, é responsável pela liberação de substâncias bioquímicas, a exemplo dos hormônios e neurotransmissores que, liberados na corrente sanguínea, inundam todas as células corporais, “pigmentando-as” de conformidade com a coloração do humor manifestado. Então, se a pessoa estiver angustiada ou aflita, muito certamente o coração, o cérebro, o estômago, os rins e demais órgãos dessa pessoa também estarão angustiados ou aflitos! Aqui se aplica a célebre máxima de Juvenal, o poeta romano: Mens sana in corpore sano. É a inexorável integração mente-corpo ou a biologia das emoções, ocupando a glândula pineal ou epífise, destacado papel nesse particular.

 Esclarece André Luiz, na obra Missionários da Luz, capítulo 2, que a glândula pineal ocupa posição de supremacia em relação a todo o sistema endócrino, que o comanda por intermédio da complexa rede nervosa. Mantendo estreita conexão como o corpo etéreo, funciona a semelhança de um acumulador de energias psíquicas que são segregadas sobre a cadeia de glândulas físicas. Vivências multimilenária da alma em trânsito contínuo pelas infinitas rotas da evolução ficaram indelevelmente gravadas na pineal em forma de emoções a influenciar, implacável, a embriogênese e psicogênese do ser. Daí a causa das teratologias e das psicopatias deformantes da personalidade a desafiar os sistemas científicos na difícil tarefa de estabelecer a verdadeira natureza desses processos idiopáticos. 

Psicoterapeuta por excelência, Jesus, já havia asseverado em seu recuado tempo acerca do elemento responsável pela produção de vidas abençoadas ou submetidas ao império das expiações dolorosas: o comportamento! Por essa razão advertiu que “A cada um será dado segundo as suas obras”. Quer dizer, a cada um será dado segundo o seu comportamento, segundo as suas emoções... Aí está, portanto, a explicação racional e lúcida sobre a causa fundamental dos males existenciais que tem afligido tanta gente. Comportamentos de ontem a projetar seus reflexos no dia de hoje e comportamentos de agora a repercutir, fatalmente, no inevitável amanhã. Cada qual é herdeiro das próprias criações fomentadas nas urdiduras do passado remoto ou próximo. Essa é a lei suprema do universo da qual não se pode esquivar.

Então, se há essa biologia das emoções que influencia, inclusive, na anatomia do ser, como um todo, indiscutível que se aprenda a viver sob rigoroso padrão de regras morais. Que a Medicina aprenda a Medicina de Jesus e ensine os pacientes que a doença, a priori, é decorrência de vidas mal vividas e de emoções descompensadas nos desvarios das paixões tresloucadas, dos ódios incontidos, das perversões brutalizadas, das vinganças desenfreadas, dos desequilíbrios da libido, das corrupções vergonhosas.